Faz mais de um ano que tivemos que pausar, que fomos forçados a nos enclausurar, mais de UM ANO! Minha referência mais próxima de ‘isolamento’ é a de quando eu e meus parceiros artísticos tínhamos que ficar enfiados em uma sala de ensaio durante muitas semanas, até levantar uma peça. E eu amava! Discutir ideias, acreditar em ideais, se debruçar sobre um tema, experimentar mil maneiras de encenação, poder errar… Me lembro de uma sensação muito particular que eu tinha: a de, no caminho pro metrô, ao término de um dia inteiro de ensaio, relembrar que existe uma vida do lado de fora, no caso: a minha, a "vida real". A verdade é que os ensaios são a minha parte preferida no processo teatral, porque é onde nós temos que testar todas as formas de vida possíveis pra representar uma história.
Às vezes o que me parece é que todos nós fomos esquecidos numa sala de ensaio, sem data da estreia.
Eu sempre tive que viver criativamente, por conta do meu trabalho e sobretudo pelos muitos meses sem trabalho. Uma das revelações desse nosso ‘retiro’ obrigatório atual é a de que todos nós, trabalhadores das artes ou não, descobrimos que, pra não sucumbir, precisamos exercitar nossa criatividade. Para não se deixar camuflar dentro deste pesadelo que entramos e do qual, mesmo com muita fé cênica, não conseguimos acordar, temos a necessidade de forçar a nossa curiosidade criativa.
Mas os estímulos são escassos e os poucos que se apresentam são duros, difíceis. Cada forma de vida que materializamos cotidianamente parece não servir pra nada no final do dia. Mas serve.
Serve pra você e isso é suficiente,
porque isso é bom pra todos. Sempre foi, né? Criar e saber se cuidar são gestos que retornam pro mundo como presentes, como pequenos milagres.
"(…) Elogiou seu trabalho, depois perguntou o que ela queria fazer da vida. Hesitante, a aluna admitiu que talvez quisesse ser escritora. Ele sorriu com infinita compaixão para a menina e perguntou: “Você tem a coragem necessária? Tem coragem de trazer à tona esse trabalho? Os tesouros escondidos dentro de você estão esperando que você diga SIM”.
Fazendo uma retrospectiva desde o começo da quarentena até hoje, eu olho pra trás e vejo o quanto eu me esforcei/esforço pra alimentar a minha criatividade, quantos projetos eu desenvolvi (essa newsletter é um deles) e quanta energia eu coloquei em pequenas ideias que, quando concretizadas, atribuíam algum sentido aos meus dias solitários. Não se trata de ignorar a realidade, mas de levantar realidades paralelas, imagens, sons, performances, pequenos atos diários… fazendo uma certa analogia, é como levantar uma pequena peça teatral por dia, mas sozinha. ;)
Mas não, não é fácil, nem simples. Romantizar o ato criativo, principalmente num momento medonho como este, seria muito ingênuo da minha parte. E falar sobre este exercício tão íntimo é sempre muito delicado porque, veja,