no primeiro dia do ano eu levei um choque. sim, um choque real. fui acender o abajur do quarto em que eu estava hospedada e fiquei presa no fio, recebendo uma corrente elétrica forte que fez tremer, principalmente, todo o meu lado direito do corpo. eu não sei dizer com precisão quanto tempo fiquei presa ali, mas me pareceu tempo suficiente para considerar a hipótese de que eu não iria mais conseguir sair daquele transe do terror. cheguei a cogitar me despedir em oração, veja, eu que mal rezo na vida real.
eis que alguma coisa vinda de dentro quis me salvar. uma força misteriosa saiu de um lugar mais enigmático ainda e chegou até a minha garganta, ganhando vida através de um grito que se parecia mais com um choro de criança ou de uma mãe em trabalho de parto. na última nota aguda deste grito: um salto! um salto para trás. silêncio. eu de um lado e o abajur do outro. a respiração ativa, o meu corpo estremecido e o abajur jogado, mudo. o abajur, um objeto inanimado. um objeto que só ganha vida quando alguém o acende. de toda forma, foi este objeto quem me trouxe de volta à vida real.
eu não quero romantizar esse tipo de situação. não desejo que ninguém aqui leve um choque, mas posso dizer que eu sou a prova concreta de uma metáfora, uma metáfora bem mediana, rs! porque levar um choque é cair na real mesmo. um choque te lembra o quanto você estava anestesiada. ver meu corpo voltando aos poucos daquele túnel diabólico em que entrei fez sim eu valorizar o aqui e o agora. eu sei, eu sei, parece tudo tão pedante. mas não é!
um choque é clichê, é literal, é redundante, é místico… e é banal quando não te mata. é tudo isso e mais o que te servir dependendo do momento em que você estiver. pra mim são várias camadas. primeiro, trouxe de volta minha percepção sobre o meu corpo, sobre ele como um todo, sobre ele por dentro, têm muita coisa circulando nas minhas veias, eu tinha me esquecido; segundo, me fez dizer obrigada por estar viva! , coisa que fazia um tempinho que eu não falava, não em voz alta, não com tanta veemência; terceiro, mostrou o quanto a minha mente mente pra mim e o quanto este hábito me distancia do momento presente. aí alguém te sacode, um choque, uma onda… e você consegue ponderar o real do irreal, o que é importante e o que não é, o que é concreto e o que é paranoia. como podemos ser excelentes em nos dizer coisas horríveis! mas veja, eu me salvei! fui eu quem me tirou daquele lugar. sozinha! eu fiquei muito “chocada” (HA HA HA).
a minha força estava escondida. estava no fundo do fundo do fundo de mim. eu precisei de um choque pra trazer ela de volta. e eu não to falando de uma força de mulher guerreira, empoderada ou coisa parecida. eu to falando da força de ser quem se é. assumir ser eu mesma. de simplesmente honrar o que eu sinto. eu digo isso porque quando eu comecei a voltar, ou seja, a parar de tremer e sacar que eu estava viva, a primeira coisa que passou pela minha cabeça foi: chega! eu vou fazer só aquilo que eu tenho vontade. quero fazer o que me dá prazer! quero agir de modo que eu seja feliz, que me faça bem! e eu sei o que me faz bem e eu sei o que me faz mal. eu sinto. e essa sou eu. em suma,
eu sou o que eu sinto
e não o que eu penso e não o que você pensa. o que sentimos é tudo o que temos! é precioso. essa é a nossa força. a conexão primeira, você com você. e o que vem de fora traz muito ensinamento, mas não pode te distrair, te tirar do eixo! (no meu caso o evento externo me trouxe de volta pro eixo, rs!).
isso não quer dizer que eu estou super bem resolvida e agora eu sei a fórmula da felicidade. não se trata disso. mas eu recuperei a ideia de força. o conceito. e ele chegou em mim através das minhas veias, aquelas que eu tinha esquecido que existiam. ser forte não é sobre fazer um esforço desmedido, é mais simples, é sobre saber seus limites. e depois saber comunicá-los. eu fiz as pazes com meu lado forte, acho que eu estava, fazia muito tempo, identificada somente com meu lado frágil.
me permito abrir uma última aba aqui: se conectar com o que você sente nada mais é do que exercitar seu estado de presença, não existe passado e nem futuro. e eu sei que parece óbvio, mas é sempre bom lembrar.
depois do choque:
a partir do fatídico choque escrevi um pequeno e chocante guia para 2023:
(você pode ler sempre que quiser, pode acrescentar itens ou fazer um só seu)
- quando estou confusa me volto pra dentro, não pra fora. reconheça o que você sente;
- eu não preciso ser submissa para ser amada, eu tenho voz. use sua voz com amor, delicadeza e firmeza e você será ouvida;
- meu sonho é do tamanho que eu quiser. nunca deixe ninguém relativizar seus sonhos. o medo dos outros não te pertence;
- eu sei quando devo me apequenar e quando devo me engrandecer. seja Sol, mas também saiba incorporar a Lua;
- eu não sou vítima, pois estou onde eu quero. você está onde você se coloca;
- eu só posso dar aquilo que me sobra. não deixe ninguém te esvaziar, cuide da sua energia;
- como todos os seres, eu sou digna de amor. aprenda a receber, deixe aqueles que te amam te surpreenderem com seus gestos amorosos;
- não posso me identificar com tudo o que a minha mente diz pois ela está adoecida por atravessamentos culturais e crenças que não me pertencem. saiba separar aquilo que é invenção daquilo que é real;
- aceito a tradição apenas quando ela significar amor. (por exemplo, o jeito que meu pai me cobria antes de dormir é o jeito que irei cobrir meus filhos, porque isso é uma memória afetiva e que, como tantas outras em minha família, poderá ser mantida). aquilo que não traz amor não serve mais, ainda que seja algo familiar. saiba romper com as crenças limitantes da sua família;
- a ansiedade não me levará a lugar nenhum. confie no tempo das coisas;
- tudo por aqui é transitório, portanto nada é meu. não se apegue a nada, nem ninguém. confie na espontaneidade daquilo que te rodeia;
- sou grata pelo momento presente. agradecer ao invés de reclamar!
- eu não desistirei de ver beleza neste mundo. estamos aqui para sermos felizes, não espere levar um choque (hehe) para escolher aquilo que te faz bem aos olhos, ao corpo e ao coração.
ufa! talvez essa lista aumente durante o ano, mas por enquanto estou determinada a cumpri-la. ela é sagrada, é uma espécie de mantra que uma guru muito sábia criou pra mim:
eu mesma. ;)
» estamos aqui para nos curar de nós mesmos «
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